Por que existimos? Para quê? Por que aqui? Por que agora? Por que dessa forma, assim, desse jeito? Por que com essas pessoas? Por que nessa família? Quando vou morrer? Como vai ser? Como terá sido minha vida? Como terei experienciado cada filme, cada texto, cada livro, cada beijo, cada amigo, cada pessoa, cada viagem...? Será que vou lembrar de sequer parte de tudo isso? Será que assistirei ao filme de minha própria existência, mesmo? Como avaliarei minha passagem por este planeta? Terei orgulho de mim mesmo? Terei pessoas com quem chorar minhas dores? Terei pessoas com quem partilhar minhas felicidades? Como será meu último Natal? Quanto gostarei de minha última janta? Terá sido a comida que gostaria de comer, se soubesse que seria minha última? Será meu último dia nesta Terra tão proveitoso quanto gostaria que fosse? Isso algum dia passará? Todos esses questionamentos, todas essas perguntas, essa angústia, esse incômodo? Se passarem, será que isso significará algo bom? Será que algum dia teremos alguma resposta pra qualquer dessas perguntas? Será que, se tivéssemos, mudaríamos algo? Se soubéssemos do fim da história, mudaríamos o que veio antes? Se tivéssemos essa possibilidade, teríamos o mesmo fim? Será um fim, de fato, afinal? Existe vida após a morte? Existe algo além do nada? Se sim, por quê? De onde veio? Para que existe? Que propósito cumpre? Existe um propósito? Pergunto-me tudo isso passeando sob uma noite um tanto pacata... E isso, por si só, já descreve muito sobre o que escreverei: uma caminhada, sem muito sentido, debaixo de uma lua oculta no quintal de minha casa na véspera do Natal.

Será que os momentos que nos influenciaram tanto foram, de fato, tão marcantes assim? Será que existe essa objetividade? Como se avaliaria isso de maneira imparcial? Todas essas perguntas inundam minha mente solitária nesse Natal. Ainda nem é meia-noite, mas já considero Natal por causa do horário da ceia. Esse ano foi cedo, já que passo a virada do dia 24 com apenas meus pais e minha avó. Será que tais perguntas também perpassam a mente de minha família? Paro para pensar no fato de que tenho uma família... Há pessoas que existem nesse mundo junto comigo e parte do tempo de suas vidas é dedicado a mim. Poderia pedir algo mais grandioso? Ainda que sejam coisas simples, vivências sutis e sempre delineadas em momentos casuais e cotidianos, são extremamente tocantes para mim. Parte do tempo de suas vidas é usado amando-me. Isso não é chocante? Não é emocionante? E fizeram isso por toda minha existência. Não houve um momento em que estive vivo que não sabia que essas pessoas existiam, ainda quando era mero protótipo de ser humano (e, veja bem, essa fase perpassou em muitos anos minha fase de "bebê"). Assim, julgo-me realizado, em certo nível. Ainda que angustiado a todo tempo, posso afirmar, sem dúvidas, que sou amado. Que sou notado... E só agora percebo isso e é por meio da percepção de como as outras pessoas relatam seus próprios momentos, suas próprias significações desses momentos. Novamente, pessoas.

Na mesa, compartilharam histórias, memórias, vitórias, derrotas... Foi breve, é verdade, mas foi tão intenso que quase chorei. Agora, aqui, em meu reduto, isolado, nunca houve tanta gente comigo. Nunca, em minha história, estive tão rodeado pela presença daqueles que amo. Nunca me influenciaram tanto. Nunca suas ações impactaram-me tanto. Cada momento que vivi e ainda me lembro de tê-lo vivido é como a tinta de uma caneta. São eles que escrevem esse texto agora. Os momentos tristes, felizes, dramáticos, melancólicos, instantâneos, duradouros, velhos, novos, enfim... Todos essenciais. Enquanto as risadas ecoam andar acima, lembro-me de um momento que erroneamente foi-me dito não lembrar mais: aquele em que minha avó fez-me dormir - em inúmeras ocasiões - fazendo cafuné em meus pés, apertando levemente cada um de meus dedos pequenos de criança. Sinto saudades... De tempos, de pessoas, de épocas, de anos, de comidas, de passeios, de instantes... Esses momentos condensam-se na tela de minha memória como vapor de banho... Formam-se sem muita nitidez, mas com grande força, arrebatando-me. Pessoas há muito não vistas, pessoas que vi há poucas semanas, pessoas que vi ontem, inclusive. Pessoas de outra cidade, pessoas de outros países, pessoas novas, pessoas velhas, pessoas interessantes, pessoas chatas, pessoas que me marcaram, pessoas que me formaram, pessoas que me fizeram e, de certa forma, ainda me constituem. Será essa a essência da vida? Conseguir tocar o maior número de pessoas possível sem esperar que elas lembrem-se de você? Será que sabemos da força que temos enquanto indivíduos para mudar outra vida? Já pararam para pensar na intensidade dessa afirmação? Mudar uma vida? Ainda que de forma boba em nosso ponto de vista, temos a capacidade e o poder para tocar profundamente outra pessoa, modificando-a em suas raízes. Prova disso é a garota que mudou-me mais em algumas semanas que outras que conheço há anos, sejam estas donas de consultórios ou não. E é irreversível. Podemos até mudar de volta para o estado, jeito ou personalidade anterior, mas nunca sem esforço. Uma vez tocados por outro ser humano, estaremos para sempre marcados e isso tem dois lados, (in)felizmente.

Vejo minha vida passando, aos poucos e, ao mesmo tempo, rapidamente, como fotos contínuas projetadas rapidamente contra uma tela. E pergunto-me todas aquelas perguntas. E, obviamente, não tenho resposta para nenhuma delas. Talvez viver seja menos do que pensamos ser. Talvez a realidade seja incapaz de abarcar todos nossos sonhos. Entretanto, creio cegamente que viver significa justamente aprender cada vez mais a lidar com esse fato. E isso não significa resignar-se: significa, simplesmente, continuar lutando até o fim. Significa aguentar as dores da vida independentemente do que ela traga. Ou até mesmo, não aguentar. Está tudo bem não aguentar, pois, se não se aguentou significa que, pelo menos até aquele instante, tentou-se. E acho que uma tentativa perseverante vale mais que um sucesso de mão beijada. Ah, meu caro... Passaremos por aqui em um instante e tudo o que nos cabe é decidir o que fazer com o tempo que nos é dado (obrigado, Gandalf, nunca esquecerei dessa frase!). Aí está! Justamente isso! Uma frase de um filme há muito tempo visto e que, até hoje, perdura em mim. Influencia-me em minha escrita de forma muito apropriada. Não sei como será (ou foi) seu Natal, caro leitor. E mesmo que o conte para mim, ainda não o saberei, pois as significações, a experiência, a vivência dele será inteiramente sua, completamente exclusiva e inédita para ti. Não serão meus os pelos arrepiados assistindo a uma situação existencial rara, não será minha a risada que alegra os outros com o sopro de teu riso, não serão minhas as lágrimas choradas ao receber uma notícia triste justamente nesta data. E, ainda assim, partilho disso tudo. Todos partilhamos. Cada ser humano, pelo simples fato de existir, sabe do que se fala. Somos todos um, em certo sentido. E só por isso é que conseguimos partilhar-nos conosco mesmos.

Espero, sinceramente, que as janelas de nossas almas estejam abertas. Ainda que só hoje, para alguns... Nesta data que sempre tanto admirei e gostei - indo contra minha própria tendência de ser paradoxalmente ranzinza, especialmente por se tratar de, geralmente, uma reunião familiar. Espero que possamos encher uns aos outros de júbilo, de amor e de reciprocidade. Espero que possamos, cada um a sua maneira, mostrar ao próximo que o entendemos, o aceitamos e o acolhemos em sua humanidade. Que nossas festas sejam, de fato, festas, regadas a emoções por vezes esquecidas. E que possamos, ainda mais, ter consciência disso tudo. Consciência de como é linda a existência, a partilha dos momentos. Momentos que escrevem nossas vidas, nossos destinos, nossas alegrias e tristezas. E se estivestes sozinho, caro leitor, durante esta noite, duvido seriamente que possa negar minha próxima pergunta: "Será que, mesmo sozinho, não fostes mencionado? Sequer lembrado? Por um alguém que talvez você mesmo já não lembra? Será mesmo?". Onde quer que você esteja, quem quer que você seja, haja o que houver, estou mandando-lhe amor. Que esse momento seja eternamente lembrado e que possamos viver nossas vidas cada vez mais conscientes de nossa finitude. Que acordemos para a realidade de que iremos, um dia, deixar de existir. E, acima de tudo, que isto não sirva para nos imobilizar, mas, sim, para fazer-nos acordar, fazer-nos andar, enfim, fazer-nos amar. Ainda que tudo que haja para amar seja a vida, em sua cotidianeidade simplória, mas, e acredito piamente nisso!, cheia de glória. Saibamos que, na maioria das vezes, o pouco é muito. A vida, afinal, é feita de momentos. É vivida em momentos. E, juntos, formam essa obra que somos ou fomos. Saibamos interpretar a tristeza como algo ruim e, ainda assim, essencial. Saibamos que o tempo que vivemos não dura para sempre e que, dessa forma, possamos conscientizar-nos para o fato de que talvez este seja nosso último dia aqui. Teria sido um bom dia? Você fez o que queria fazer há tempos antes de ir embora? Você aproveitou seu tempo, seu dia, seu momento? Você se aproveitou? Você se usou para ser feliz ou para deixar os outros menos felizes? Você esperou para fazer aquilo que tanto queria ou precisava fazer? Ou você fez? Hoje, ouvi que o lugar mais rico do mundo é o cemitério. Nele, existem infinitos sonhos, projetos, casas, famílias, amores, experiências. Entretanto, estão todas estas coisas tão mortas quanto seus donos. Gostei dessa reflexão... Espero que meu túmulo seja o mais existencialmente pobre possível e que toda a vida que há em mim seja distribuída, por mim ou por outrem, para aqueles que precisam e podem dela usar. Sugiro que faça o mesmo. Um beijo, caro leitor. Saiba que, de alguma forma, és meu amor. Se sabes da existência desse texto, é porque, em algum nível, tens reservado um espaço em meu coração.